quinta-feira, 28 de abril de 2011

Vipassanā


Vendo um horizonte amplo
Pela moldura foco da janela.
Sentindo o cheiro da chuva
E o frio do vidro na ponta dos dedos.

Olho adiante e procuro sentido.
Entre a paisagem distorcida pela neblina
A certeza do que existe pela memória
E o medo continuo por não conseguir
Distinguir através da visão.
Tendo surtos por não entender o que é
Verdade entre abraços partidos
E vidas que tento convencer a fazer parte da minha.

A chuva distorce,
A bruma deixa misterioso o óbvio.
Só consigo pensar se hoje
Ainda consigo supor a chuva que me encantava na infância
Ou as mudanças de tempo previstas.
Minha cabeça vaga e divaga
Buscando o sentido do trivial.
Percebendo entre as lágrimas que escorrem pelo vidro
A dor e significado da minha própria tristeza e dúvidas.

Penso nos pontos finais precipitados,
Nas virgulas...
Quero voltar sem ter que dizer de onde vim.
Mas o que faço quando sinto tanto vazio num abraço?
Falta o que dizer e pronuncio palavras que não são minhas
Vendo o nada diante de uma janela difusa.
Me vem a mente apenas o calor de um abraço inesperado
Do você que desamarra os nós da minha garganta,
Da sua mão que recolhe meus pedaços e junta em algo melhor,
Do você que coloca no papel meus momentos surdos
E do carinho que me transforma.

Eventualmente tudo acaba,
mas se escrevo...continua.


Por: Fabíola Alcazzar

quinta-feira, 21 de abril de 2011

A METAMORFOSE DAS CRISÁLIDAS NÃO SE DÁ NESSA ÉPOCA DO ANO – TRATE DE SER FELIZ POR CONTA PRÓPRIA

Hoje é sexta-feira e falta ânimo para começar as coisas que já começaram. Três dedos de vinho flutuam dentro do copo. Ecos de um passado não tão distante impresso nas fotografias. Tudo o que penduro nas paredes é apenas um registro para sentir saudade. Mas não sinto. Os cafés tem sido absorvendo Thoreau e me surpreende a forma como certos pensamentos se popularizam a ponto de virarem pockets vendidos pela lpm na rodoviária de Passo Fundo. Se a busca for a ancestralidade, é quase certo que você terá algum público. Os malditos estão aí para atestar a ausência de dentes. Os pingos não cansam de escorregar entre as folhas do abacateiro e o som da natureza desperta em mim o tempo em que habitávamos as florestas. Eu devia ter visto Tio Boonme. De vez em quando o ruído forte de um ônibus espacial chega até os fundos desse apartamento colado no meio de uma grande capital, mas depois volta o silêncio. A maior das Américas. A melhor das Américas. Haveria grilos entre as folhagens do quintal se o urbanismo não tivesse aniquilado quase todos os reinos de pequeninos ecossistemas cabalísticos. Caberiam mundos no lado escuro da sombra das plantas. Xamanismo Urbano ou Fever Ray. É quase tudo a mesma coisa. Há uma festa microscópica e só nós não. Haverá ainda muitos dias em que todos deixarão a cidade, menos você. Só faça questão de ter algumas garrafas. Prepare-se para a abstinência decorrente de quando todos se vão. E para ser uma pessoa produtiva que entrega longos textos em prazos tão curtos. Aperte mãos de desconhecidos e deite na cama de quem não sabe o seu nome. Só não esqueça de tentar trazer de volta um resto daquilo que você foi antes de ser quem você é. Há todo um carnaval pela frente e nenhum de nós tem corpo para. Se ainda quiséssemos sair sozinhos. Se ainda nos iludíssemos com a beleza dos encontros que se dão ao acaso. Trabalhe sempre um pouco mais. Depois volte para casa ouvindo Band of Horses e jurando que vai gravar as coisas mais bonitas porque é noite de sexta feira e porque chove e porque sobraram ainda tantas garrafas de vinho e inspiração. Garrafas de vinho o bastante para fazer você escrever e gravar tudo o que você planeja há tanto tempo. Mas você chega em casa e o caderno de versos perde o sentido a cada repetição de frase: porque você quer falar isso? Corre-se o risco de jogar tudo fora: o que você quis dizer com isso? Descartar arquivos carregados de gravações. Se liberar espaço é o segredo da criação e a eternidade do artista é tentar capturar o presente, então pode ser que a generosidade do mesmo seja nunca lamber o próprio rabo.


Por: Ismael Caneppele

quinta-feira, 14 de abril de 2011

Senhor de Estranhas Manias


Cativas minha alma
Cativas minhas palavras e pensamentos
Dom que quase nenhum outro possuiria
Cativas desejos por arte

Meu senhor de tardes tardias
Faz crescer em meu peito a esperança
Em dias onde reconheço a alegria
Não seria difícil amar-te

Cativas minha sorte
Cativantes palavras que eleva-me em seus momentos
Preso à mais ínfima sintonia
Cativante desejo de te ser fiel por morte

Senhor de estranhas manias
Faz-me forte ao ler teu brilho de criança
Dias que me pergunto por onde andarias
Não seria fácil perder-te:

Raio de sol que ilumina.
Fonte de energia que contemplo.
Parte de mim, seja sempre poesia,

viva,
pulsante,
por entre meus olhos
dedos,
dia-a-dia.


quarta-feira, 6 de abril de 2011

Em Miami o Horror é não dançar!

Vou fugir um pouco do padrão do Esqueleto nesta postagem.
Quem acompanha o blog sabe que raramente escrevo sobre uma ocasião especial, mas as vezes se faz necessário narrar certos acontecimentos.
Os australianos do Miami Horror (por isso o trocadilho infeliz do título) estão fazendo uma mini turnê pelo Brasil e Porto Alegre (mais especificamente o Porão do Beco; famosa casa de festas do underground da capital gaúcha) foi um dos destinos.
To explicando mas sinto estar fugindo do assunto em sí, por isso vou tentar ser mais dissertatívo e direto, apesar de estar etilicamente alterado.
O fato é, pela primeira vez na minha longa vida eu ganhei uma promoção que não fosse a do palito de picolé dando direito à outro Fruttare de limão.
Sem muita pretensão decidi responder uma pergunta qualquer no site sobre a banda e ganhei um ingresso pro show.
Fiquei feliz e um pouco decepcionado por não ter uma companhia que se motivasse a pagar R$ 60,00 para ver uma banda que apareceu "ontem".
Mas depois de pensar um pouco, liguei o "foda-se", tomei um banho, catei uma roupa qualquer e rumei para a AV. Independência.
Lá, as mesmas ruas, mesmas luzes e mesmas prostitutas continuavam nas mesmas esquinas que sempre passo quando quero beber e dançar ao som das pick ups dos meus DJs favoritos.
Não havia fila e apesar da demora em acharem meu nome na lista a espera foi muito pequena.
A banda que prometera entrar no palco até 22:30 hrs entrou as 23 hrs, o que pouco importa pra um desempregado sem pressa como eu.
Lá dentro começa a parte difícil de descrever, posso começar dizendo que estava bêbado depois das 3 cervejas que tomei logo de começo, talvez na esperança de me soltar e conseguir aproveitar sozinho algo que até então era um mistério.
Mas acabaram sendo inúteis, cada cerveja foi completamente inútil e desnecessária.
Ninguém precisa de álcool para dançar diante dos grooves espaciais e elegantes tocados pelos "oceânicos" do Miami Horror.
Entre curtas e carismáticas frases em português, a banda presenteou rítmo e deu uma aula de competência musical para os pouco mais de 300 espectadores.
"Baterias syncadas, teclados à lá French House, baixos groovados, guitarras ora funkeadas ora distorcidas e vocais impecáveis misturados com uma energia contagiante." - É assim que defino o show do Miami Horror afinal, a maior revelação da Austrália do final da década passada.
Me senti como se a banda estivesse tocando na minha festa de aniversário.
Mas agora chega, to bêbado e morrendo de sono em plena madrugada de quarta feira. Porém, animado por saber que irei dormir satisfeito por tudo que ví, ouví e dancei na noite passada!

Por: Yuri Pospichil

segunda-feira, 4 de abril de 2011

Não existem abelhas na noite das agulhas

Me incomoda um pouco enxergar neste rosto velho um pouco de mim.
A fraqueza nas pernas magras e os tremores que ocasionalmente atingem as mãos com seus dedos curvados, me atordoam e fazem ter vontade de fugir.
Talvez devesse me sentir culpado por comover-me mais com uma vida que chega do que com essa que aos poucos se vai.
Afinal há uma parte da minha história deitada nesta cama, meu sangue, meu sobrenome.
Talvez devesse me sentir culpado por não sentir-me tocado por esses laços naturais.
As vezes penso nesses vinte e poucos anos que nos conhecemos, lembro de tantas histórias, a maioria da minha infância. Lembro de como gostava da chácara e me orgulhava de contar para meus amigos sobre a tua profissão. Mas penso também que nunca fomos próximos o suficiente. Nos respeitamos e temos carinho um pelo outro, é verdade. Mas não tenho convicção de afirmar um sentimento maior, e talvez devesse me sentir culpado por isso também.
Nunca pensei te ver assim, tão dependente.
Nunca imaginei ouvir esse sotaque tcheco-germânico soar tão fraco e melancólico.
Penso que deveria me sentir culpado mais uma vez por ser tão parecido com meu pai e não conseguir a sintonia necessária para amá-lo da forma como deveria.
Sinto que deixei de aprender muito e que também deixaste de ensinar um bocado.
Sinto falta dos carros velhos, das boinas cinzas e dos sapatos sujos de barro que deixavam minha mãe louca por sujar o tapete da sala.
Sinto falta das brincadeiras ao telefone, dos favos de mel e das abelhas.
Talvez devesse me sentir culpado por tudo isso...mas não me sinto!


Por: Yuri Pospichil

Fluxos Químicos Desordenados


Escute, um momento.

Tome essa chave.

Eu sei, parece bem pequena.

Mas abrirá aquela porta.


Todos os sonhos estão lá dentro.

Guardados em pequenos sacos de tecido
pintados com as cores da manhã
que essas angústias te fizeram esquecer.


Agora vá!


Por: Rimini Raskin

Sobre Nomes Impróprios e a Madrugada



As ausências me intrigam.

Me encantam.

Me consomem.

Fazem da minha carne um fantasma
refletido no canto inferior direito
do obsoleto tubo de imagens.

Não estou no que não existe...

Mesmo que estar valha tanto quanto
viver uma vida que também não é!

E se o telefone não toca?

Deveria ele ainda possuir esse nome?

...



Por: Rimini Raskin