terça-feira, 29 de março de 2011

Voltando pra casa, voltando pro nada



Não sei ao certo a dimensão dessas palavras ou o que elas poderão significar para quem as ler, mas sinto que escrevê-las aqui me tira um grande peso, o peso de ser quem sou.
Durante os últimos anos venho buscando afirmação externa, aceitações em massa e amores banais mas aparentemente necessários para uma vida um pouco mais "normal".
Longe de mim querer me incluir nesse rótulo pós-moderno de "alternativo, solitário e incompreendido", até porque ser triste não te faz melhor do que ninguém, pelo contrário, te faz ser triste apenas.
Mas o que realmente estou tentando dizer é que abrí mão de um bocado de alma para me ajustar à certos padrões (a maioria deles nada saudáveis, admito), que talvez suprissem o vazio que eu levo no peito. Um vazio que já tentei preencher com as mais variadas maneiras. Desde a mais revolucionária caridade e desejo de justiça social até o lirísmo pacifísta que teria o poder de salvar a existência por meio da beleza poética.
Todos as tentativas e personalidades eram reais, acreditei de verdade em cada uma das idéias, mesmo quando as intercalava com inconsequências etílicas e rock n' roll.
Todas elas foram frutos de uma época onde realmente nunca me amei, mas que conseguia me admirar e sentir um orgulho enorme sempre que me olhava no espelho, uma época onde me sentia deslocado e inútil por não defender uma causa maior.
Todas as paixões dessa época foram extremas, com nenhuma delas eu soube lidar de forma saudável e moderada. Nessas paixões incluo as amorosas também, todas inesquecíveis como cicatrizes de guerra e lindas como livros de história que deveriam ser usados muito mais para escrever o futuro.
Isso tudo passou, foi se moldando, adquirindo novas faces por conta de grandes desilusões, novas fugas foram sendo usadas, alívios sintéticos, sorrisos com prazo de validade de horas. O medo de ficar sozinho me arrastou para as multidões, no meio dela conheci e escolhi uma nova família, todos fugitivos como eu, todos com medo de ficarem sozinhos, com medo que a música parasse de tocar antes de estarem prontos para pararem de dançar.
Algum tempo se passou desde essa última mudança e parece que agora sinto a ressaca da grande embriaguez que foram esses anos.
Não apenas eu, minha família escolhida também compartilha dessa sensação de estranheza que cresce junto com os espaços entre os encontros, os muros crescendo entre todos nós, a música tocando baixinho no ambiente e as censuras que pouco a pouco dominam nossas relações.
Criamos imagens uns dos outros durante esses últimos anos, acreditamos que nada mudaria e que poderíamos fugir eternamente da velhice, da tristeza, das responsabilidades, dos silêncios e da solidão. Mentimos o tempo todo ao dizer que não nos sentíamos tristes e angustiados às vezes. Censurávamos a tristeza um do outro por medo de admitirmos a nossa, e hoje chegamos ao ponto de censurarmos até mesmo a alegria.
Passamos de uma família de crianças sem pais para uma familía com adultos demais ocupando a mesma casa. Não haveria problema nenhum nisso se não fosse o fato de não sabermos lidar com a vergonha que sentimos de nós mesmos e dos novos medos de parecermos ridículos e desajustados.
Medo de parecermos novamente os bastardos de coração mole que não precisavam de desculpas para trocar um abraço e um beijo sincero, que falavam besteiras sem trava e dançavam como malucos só para acreditar que lá fora era lá fora e aqui dentro ninguém poderia nos machucar.
O que mudou não foi o fato de ter aprendido a me amar, isso eu nunca aprendi, o que mudou foi o fato de não mais me sentir orgulhoso e não conseguir admirar a mim mesmo.
Tenho certeza que se alguns de vocês acabarem lendo essas linhas até o final, irão inevitavelmente me censurar.
Mas não sem antes refletir só um pouquinho e sentir medo da verdade que levam no peito.
Amo cada um de vocês, independente do que outras pessoas pensavam e pensam sobre nós, mas não posso jamais conviver com essas novas censuras enquanto todos fingem não saber o que foram.
Sinto necessidade de me encontrar novamente e medo de ser julgado por isso. Na verdade sempre sentí isso e durante anos escondi uma parte bem grande de mim por medo dessa censura.
Mas então quem é o censor agora? - Todos nós somos.
Só que cansei de abrir mão de demonstrar minha tristeza, minhas paixões, meu afeto e muitas das minhas idéias. Cansei de tentar me manter alegre o tempo todo para passar segurança e tranquilidade para todos nós. Até por que é sempre mais fácil viver quando estão todos sempre alegres, independentemente da veracidade do sorriso.
Sim, muitas vezes me sentí desconfortável e mentiroso.
Sim, muitas vezes odiei atitudes e palavras que saíam da boca de vocês.
Me sentí humilhado e acuado algumas vezes.
Sentí saudades do passado e de ser os muitos que fui antes de conhecê-los.
Mas acima de tudo, amei cada um da melhor forma que pude.
Seremos irmãos bastardos para o resto da vida.
Cheios de defeitos e manias terríveis, mas com uma ligação indescritível.
Espero que pelo menos entendam minhas atitudes daqui para frente, preciso recuperar meu orgulho próprio para quem sabe encontrar o amor que busco a tanto tempo.
Desejo que nosso maior medo nunca se realize e que nosso Rock n Roll seja cantado para sempre!


Por: Yuri Pospichil

4 comentários:

  1. as vezes não é o que sabemos e sim o que aprendemos... e esse aprender é ter a nossa volta pessoas sem as quais não conseguimos viver... mas temos que deixar...
    acho que não poderia dizer isso a ninguém que pudesse entender tão perfeitamente..

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  2. Acho que só os amantes da escrita conseguem entender a necessidade que é escrever. Colocar em uma cadeira o eu lírico e o peso do mundo para descansar.
    Somos os ditadores de nós. Amarramos cordas suicidas como se fossem colares ao pescoço. Fingimos não perceber. Percebemos fingir.
    Às vezes o disco arranha e a melhor das melhores músicas fica insuportável.
    Também estou desajustada, o despertador toca na hora de dormir.
    Sua sensibilidade é admirável, ainda que isso não seja sentido aí dentro.

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  3. Verdade é uma palavra pequena de significado abstrato. Teu texto a torna grande, pesada, e de significado muito claro. Páro e me percebo confuso. Não sei se gosto mais de tuas mentiras, que me encantam, ou de tua verdade, que comove ao sentí-la como uma verdade universal. Uma mesma verdade para todos nós que escrevemos e mentimos. Para todos que se enganam com onirismos. Um texto tão grande e com um desabafo tão sincero é digno da atenção de todos. Afinal, se temos tempo para as fantasias da alma, deveríamos ter mais tempo para as verdades da carne.

    Honestamente não sei até que ponto me identifico com a tua pessoa. Não sei se essa identificação é ilusória. Páro e reflito agora. Penso que a angústia de não saber pra onde ir, nem como ir, é o que pode haver de mais próximo entre nossos mundos. E claro. A dúvida, do que vale ou não a pena, se é que algum dia valeu.

    É estranho. Talvez impossível de explicar, e você bem sabe. Jamais vou te censurar por querer se encontrar. Quem não quer? - Só realmente me pergunto se é possível se achar, e se isso for possível, duvido que tenhamos que nos achar somente uma vez na vida. Provavelmente teremos que fazer isso várias vezes, e sem perspectivas de melhoras, somente movidos pela fé.

    Sabe, Yuri, gosto de falar sobre o tempo. O tempo me toca, me tortura, me felicita, me absorve.Te conheci neste espaço e talvez jamais conhecerei a ti fora dele. Talvez eu conheça uma parte de ti que a maioria não conhecerá, assim como os próximos a ti conhecerão uma parte que jamais imaginarei. A vida é assim, o mesmo vale pra ti. A possibilidade que o mundo virtual abre às pessoas é maravilhoso, pena que poucas pessoas saibam usar.

    Abrir-se assim, em cadeia universal, é algo que não exige tanta coragem quanto falar aos teus próximos como te sentes. Talvez o motivo seja simples. Falar aqui, não modificará talvez tanto a tua vida quando falar aí. Uma vez que o virtual pode interferir em quem tu és mas somente o real possibilita mudanças físicas em tua vida.

    A internet pode ser comparada aos nossos pensamentos e as coisas concretas. As coisas concretas ocorrem porque você pensou nelas antes de elas existirem. A internet é o nosso pensamento vagando pelo pensamento de nossos amigos virtuais, na esperança que eles concretizem algo ou que nos façam concretizar. Na verdade não passa de um rascunho do que queremos/temos que fazer no real, se quisermos concretizações reais.

    Sem esoterismos. Eu poderia ter conhecido qualquer pessoa aqui, mas eu conheci a ti. Me alegro por isso independente se for acaso ou destino. Acho que os motivos não importam nesse caso, mas sim os frutos que temos colhidos um com o outro.

    Obrigado pelas verdades que me falou aqui hoje. Não poderia ter feito melhor, apenas diferente.

    Abraço.

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  4. Todos os comentários são maravilhosos de ser lidos.
    Alcazzar com seu conhecimento de causa e sensibilidade para me conhecer tão bem de forma quase mística.
    Monique com sua visão de quem chega agora no esqueleto, mas demonstrando possuir um talento enorme e digno dos mais altos elogios.
    E Rogers sempre funcionando como meus espelho de verdades. Pondo-me sempre frente a frente com a realidade, com o plano concreto de toda arte e de todo desabafo. Tuas palavras são o termômetro da minha falta de coragem.

    Obrigado a todos, se ainda escrevo é pelo prazer de ler o que vocês tem a me falar!

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