quinta-feira, 19 de abril de 2012

Dos dias em que as poças nos molham as meias



Quando fecho os olhos
vejo um homem
e ele é jovem
e ele caminha

Carrega uma pasta
por uma estrada
e
nela passam ônibus
e
um enorme cemitério
que não passa
nem fica
por trás dos muros

Na carteira
nenhum dinheiro
nas meias furadas
se apoia
um sapato bege
velho e feio
um presente
de quem?
ele nem lembra

Na cabeça
apenas uma canção argentina
e
dor nos músculos da perna
e
bolhas nas plantas dos pés

Ele não tem emprego
por isso não tem
pressa
Caminha há mais de duas horas
A água molhou as meias
nem frio
nem quente
nem sente
tão pouco

Não tem mulher
ele não tem
De porta em porta
ele
não
tem
quem o deixe passar
nem um telefone que toque
ele
não
tem
outra saída

As folhas se vão
nas mãos de porteiros
entre janelas e guaritas de segurança
em cooperativas de caminhoneiros
elas
simplesmente
se vão

Entre
os que passam
ele
simplesmente
se esvai
aéreo
heterodoxo
quase decomposto

Ele se vai

Para casa
uma cadeira
e
uma mesa
com pratos
mãe e irmão
arroz
e frango cozido

E
na pasta vazia
deixada de lado
quem sobra
é o mundo.



Por: Rimini Raskin

2 comentários:

  1. Belo poema. Quando fala no final sobre o que sobra, que é o mundo, está se referindo a coisas que não se pode explorar naquele momento? Esse é um sentimento que tive. de ter na pasta coisas inexploradas que não se pode pegar ou ter naquele momento. Coisas que faltam ser vividas.

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    1. Não sei o que seria dos meus poemas sem o teu talento para interpretar.

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