domingo, 6 de setembro de 2009

Primeira Página 26/04/2004


Não vejo momento mais oportuno para começar um diário do que esse.
Minha cabeça fervilha e minha boca é forçada a abrir-se continuamente por uma tormenta de idéias revoltosas.
A confusão está implantada a minha volta e em cada uma de minhas vidas. Já não possuo os mesmos olhos, a sistemática frívola da "sociedade civilizada" me incomoda de tal forma, que sou forçado a segurar minha língua (e algumas vezes meus punhos), para evitar um conflito com suas mentes estreitas e preconceituosas.
Ontem fui ao centro de Porto Alegre. Encontrei-a da mesma forma que a havia deixado, com suas milhares de pessoas atarefadas, seus prédios altos, seu clima húmido, suas ruas sombrias, os mesmos mendigos e a mesma indiferença para com os tais.
Indiferença essa que aprendemos ainda na infância, tão enraizada no subconsciente que já nem percebemos mais.
Ensinam nossas crianças a temerem os mendigos como bestas horrendas, corrompidas pelas próprias escolhas erradas.

Não discordo que muitas vezes são frutos de más escolhas, mas para mim é tão difícil julgar essas escolhas sem levar em consideração toda uma realidade sócio-política e cultural que a aquela pessoa enfrentou.
Por isso me revolta tanto o descaso com esses irmãos, com a falta de interesse nas políticas de reinclusão.
Não percebemos que com nossa renúncia estamos obrigando seres humanos a lotarem nossas calçadas como cães e viverem do nosso lixo mais imundo. O frio e a fome e a imundice, são apenas reflexos de um corpo que teve a alma roubada e seus sonhos destruídos por um mundo que ainda se divide em classes, entregue a corrupção.

Mas nada me tocou tanto quanto a visão de uma indiazinha que atravessava a Borges para se juntar a sua mãe e irmãos, sentados na outra calçada, dividindo espaço com pedestres que os ignoravam.
Sobreviviam da venda de sua arte, uma arte que não interessa em nada ao homem branco.

Não posso aceitar ver os filhos da terra sendo tratados como vermes, ou pior, como intrusos em seu próprio chão. Um povo já quase sem identidade, sem cultura, sem liberdade, todas corrompidas ou esmagadas pelo "progresso" assassino. Senti vergonha, senti muita vergonha.
À noite, na escola, decidi dar minha contribuição em uma discussão sobre reforma agrária durante a aula de história. Meu professor me classificou como um comunista utópico. O rótulo não me desagradou não, acho que precisamos de utopias, pois elas nos forçam a buscar sempre pela melhora, nunca nos acomodando enquanto não alcançarmos o objetivo final. Como em uma utopia a meta é inalcançável, nos obrigaremos a buscar pela melhora eternamente.
Não posso negar também as barbáries cometidas por lideres comunistas mal intencionados, corrompidos pelo poder e pela ganância.
Homens que desgraçaram a imagem do socialismo.
Mas a idéia segue viva, nas mentes e corações dos que realmente lutam pela justiça.

Quando Ernesto falou que constituímos todos uma única raça mestiça, percebi que não era só a asma que nos assemelhava. E realmente acho que nunca estivemos tão perto de criar uma América Latina unida como nos tempos de hoje.
Devemos unirmos a nossos irmãos, sócio-político e culturalmente, contra o despotismo norte americano, criando uma espécie de integracionismo latino americano.

Isso é só uma parte do que tem por vir.
A revolução tem sono leve e está a muito tempo adormecida.
É melhor os cowboys de Washington e seus "aliados" não fazerem muito barulho, pois a revolta é uma jovem senhora que normalmente acorda zangada!!


Por: Yuri Pospichil

5 comentários:

  1. Primeira página do meu velho diário político.

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  2. Gente. Yuri, quando tu falou que tinha um diário político quase não acreditei. Hahaha

    Agora vejo parte dele sendo compartilhado. Incrível teus pensamentos e tuas percepções para os 16, 17 anos.

    "Acho que precisamos de utopias, pois elas nos forçam a buscar sempre pela melhora, nunca nos acomodando enquanto não alcançarmos o objetivo final."

    Também penso assim. O que seria de nós sem os sonhos?
    Sem a esperança pelo melhor (o melhor de verdade: P.L.U.R.)?
    Acho que mesmo compartilhando ctg muito das tuas idéias, ainda assim tu consegues sempre me acrescentar.'

    É muito bom te conhecer cada dia mais.
    Aguardo futuros posts do teu diário político.
    Abraço

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  3. " Yuri, o revolucionário " ... eu gosto desse seu lado!!!E das conversas infindavéis de madrugada ...

    Bjinhos , babie.
    =*

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  4. "...A confusão está implantada a minha volta e em cada uma de minhas vidas..."

    Eu poderia explicar minha realidade e grande parte da minha personalidade com essa frase.
    Tenho muitas vidas, faces diferentes e necessárias. Situações, ambientes e pessoas diferentes, mas todas em meio a confusão do dia-a-dia.

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  5. Hshuahsuahskdjskjjkdfkjadk
    Ayanne e eu estamos em algumas das tua vidas e vivenciando certas confusões implantadas à tua volta. Assim, claro, como muitas pessoas mais.

    Somos personagens de um filme aparentemente sem script.
    Que emocionante que isso se torna para nós, protagonistas dos
    nossos próprios filmes, tão doidos quanto o teu! huahsuahsua

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